É comum no período do Natal
surgirem ou se ampliarem ações de solidariedade. Pessoas se desculpam de
falhas, amigos se reconciliam de pequenas divergências. O coração fica mais
afetivo e compreensivo. As pessoas se buscam e se encontram e muitas vezes se encantam
entre si. Encontram virtudes onde antes só enxergavam defeitos e se descobrem
tão próximas quando se imaginavam tão distantes. Esses sentimentos não trazem
mal nenhum, ainda que sofram da provisoriedade de fins de ano.
Passado o festejo de Natal,
surgem os preparativos para as festas e as promessas para o Ano Novo. Na
prática, existe uma certa paralisia individual e coletiva no ano que termina à
espera do ano seguinte.
Nada que desabone o festival de
bondades do período, mas não passam de alívio d’alma, principalmente para quem
deixou escapar o ano inteiro sem nenhuma ação prática que melhorasse a família,
o grupo de amigos, o bairro ou somente outra pessoa diretamente.
Quem busca a remissão dos pecados
no fim do ano utiliza muito a expressão “se eu pudesse, eu ajudaria”. Essa
justificativa nunca vem isolada. Ela costuma vir antecedida da indução àquele
que pode que faça aquilo que o outro faria se pudesse; ou após uma crítica a
alguém que sempre poderia ter feito o que o crítico não fez.
Esse posicionamento varia de
frases, que têm o mesmo significado e trazem o mesmo resultado zero. “Se Deus
me ajudar...” “Se Deus quiser...” “Se Deus me permitir...” E com a mais
utilizada: “Deus ainda vai me ajudar...” E, quando é mais invejoso, costuma
comparar-se a você materialmente – a quem se refere – “se eu tivesse condições
como você”. Ou elogia com disfarce, a reconhecer a própria fraqueza: “graças a
Deus que você pôde ou pode ajudar”.
Concomitante às promessas para o
ano novo surgem queixas, com maior intensidade sobre parentes e amigos ausentes
“quando mais se precisava”. Trata-se de queixa unilateral, sem nenhuma
autocrítica, se não faltou quando os amigos do lado de lá também precisaram.
Esse ressentimento se generaliza
mais como disfarce, mas sua concentração fica com a questão material, de
dinheiro mesmo. “Quando eu estava numa boa, estava cercado de amigos”, costuma
bradar e emenda com um “quando eu fracassei ou passei por dificuldades, sumiram
todos”. Não se dá conta de que ele também aceitou e se glamorizou quando estava
cercado de bajuladores. Estava tão cego que nunca percebeu que jamais foram
amigos! E que o “reclamão” da vez pode ser aquele amigo “caderneta de
poupança”: o que faz pelo “amigo” é um investimento que espera receber em
dobro. O mundo está cheio de amigos que pagam um cafezinho já esperando receber
dois, três ou muito mais do que isso.
Já que falta espaço para definir
tanta gente “boa”, reforço o argumento com frase do cantor Chico Cesar quando
diz: “Deus me proteja da maldade de gente boa”. Dessa gente que só se acha
merecedor a receber e quando dá é esperando o retorno imediato do investimento.
Que em 2017 as pessoas apliquem
em planos próprios de investimentos e fiquem certas de que amigos de verdade
não são cadernetas de poupança.
Pedro Cardoso da Costa –
Interlagos/SP para o JV
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