Manaus - A facção criminosa
Família do Norte (FDN), que age dentro e fora dos presídios do Amazonas, tinha
projeto de eleger políticos no Estado, de acordo com reportagem exibida, ontem,
no programa ‘Fantástico’, da Rede Globo de Televisão. De acordo com a
reportagem, as investigações da Polícia Federal (PF) apontam que, a partir das
conversas com autoridades do Governo do Amazonas, na campanha eleitoral de
2014, os chefes da facção decidiram dar um passo mais ousado e traçaram um
plano para as eleições seguintes, de 2016. O objetivo era eleger vereadores e
prefeitos comprometidos com os interesses da organização criminosa.
Em nota, a assessoria de imprensa
do Governo do Amazonas diz que “em hipótese alguma compactuou com qualquer
organização ilícita” e se disse vítima de “ataques” de “opositores e
oportunistas”.
Gravações mostraram conversas
entre políticos e chefe de facção em Manaus. Entre elas uma em que ‘Zé Roberto
da Compensa’, um dos líderes da facção, teria ordenado massacre no Complexo
Penitenciário Anísio Jobim (Compaj) em Manaus, no início do ano. Em 2014, o
traficante falou abertamente com o então subsecretário de Justiça, o major da
Polícia Militar Carliomar Barros Brandão. “Nós tem tudo, nós tem dinheiro, nós
tem arma, tem tudo. Se mexer com nós, se mexer com nossa família, nós vai
mexer”. Carliomar negou que receba dinheiro da facção.
Em 2014, o próprio chefão do
tráfico falou abertamente sobre o assunto com o então subsecretário de Justiça.
As conversas foram gravadas durante encontros entre Zé Roberto e o major.
Jose Roberto Fernandes Barbosa:
“Que ele prenda nós lá fora com droga, a polícia prendeu com droga eu não tô
nem vendo. Mas que não venha pertubar nós”.
Major Carliomar: “O que ele quer é sempre a paz na cadeia”.
Major Carliomar: “O que ele quer é sempre a paz na cadeia”.
A conversa aconteceu em outubro
de 2014, entre o primeiro e o segundo turno das eleições pra governador. Pouco
mais de dois anos depois, em 1º de janeiro deste ano, segundo a polícia, foi Zé
Roberto quem deu a ordem para o massacre no Compaj. Foram 17 horas de rebelião,
56 mortos com brutalidade. Ao todo, 119 presos que conseguiram escapar. A onda
de violência nas cadeias se espalhou pela Região Norte.
De acordo com as investigações, a
causa das rebeliões e mortes é uma guerra entre a facção de Zé Roberto, que
controla o crime no Amazonas, e um grupo rival, das cadeias da Região Sudeste.
A disputa entre os dois grupos não era nenhuma novidade para o Governo do
Amazonas.
“Nossa ‘Faccao’ é ‘tao’ Franca...
Que ‘nos’ elegemos foi um ‘govenado’... ‘So’ isso”. Esse é um trecho da
conversa entre os traficantes José Roberto Fernandes Barbosa, o ‘Zé Roberto’, e
João Pinto Carioca, o ‘João Branco’, líderes da facção Família do Norte (FDN),
apontada pelo governo do Estado como responsável pelo massacre no último dia
1º, no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), publicadas pelo DIÁRIO no
início de janeiro.
As conversas por mensagens
foram interceptadas, em outubro de 2015, com autorização da Justiça, durante
investigações da Polícia Federal (PF) que culminaram na operação La Muralla.
Para a PF, o diálogo se refere ao apoio dado pela organização criminosa
envolvida com o tráfico à reeleição do governador José Melo, relação esta que
está sendo investigada pela PF.
Um ano antes das interceptações
da PF, uma gravação feita dentro do Compaj, gravada uma semana antes das
eleições para o segundo turno para o cargo de governador do Estado, mostra uma
conversa entre o major da Polícia Militar (PM) Carliomar Barros Brandão, então
subsecretário de Justiça e Direitos Humanos, com Zé Roberto. Durante a
conversa, o oficial pede apoio ao traficante para as eleições de 2014, em troca
da “paz” dentro dos presídios de Manaus.
Durante a conversa, Zé Roberto,
segundo o áudio, diz: “Vamos apoiar o Melo, entendeu? A cadeia…vamos votar
minha família toda, lá da rua, entendeu? Não tem nada não, a gente não conhece
o Melo (trecho inaudível), a gente quer dar um alô, que ele não venha
prejudicar nós. E nem mexer com nós”, pede o narcotraficante, que atualmente
cumpre pena no presídio Federal.
Como forma de acordo, o então
subsecretário de Justiça e Direitos Humanos, major Carliomar Brandão, que logo
após ter sido exonerado do cargo voltou a assumir o comando do Batalhão de
Trânsito do Estado do Amazonas (Batran), cargo que ocupa até o momento, fala:
“Não, ele não vai, não... A mensagem que ele mandou para vocês agradeceu o
apoio e que ninguém vai mexer com vocês, não”, afirma o oficial.
Para garantir que a promessa seja
cumprida, Zé Roberto cita ocorrências como ataques criminosos registrados em
outros Estados. “Tá vendo o que está acontecendo em Santa Catarina (vários
ataques)? É o comando dos caras, que estão rodando lá por causa do governo dos
caras. Tá vendo aqui, a cadeia tá tudo em paz porque o governo daqui não mexe
com nós”, disse o traficante.
Mais uma vez, o major garante que
não haverá represália. “O que ele quer é isso, é a cadeia em paz”. Diante da
afirmação do oficial, Zé Roberto fala do número aproximado de votos que a
facção pode dar ao candidato: “Eu acho que de voto ele vai ter de nós mais de
100 mil votos”, cogita Zé Roberto.
Nota da Secom disse que
governador José Melo repudia a tentativa de lhe associar a criminosos
Em nota, em notícias anteriores
sobre escutas que ligam o governo à FDN, a Secretaria de Estado de
Comunicação (Secom) respondeu que “o governador José Melo repudia a tentativa
de lhe associar a supostas negociações com criminosos ou de ter usado forças
policiais durante as eleições de 2014”. A nota prossegue dizendo que “o
processo está em fase de instruções e os advogados que fazem a defesa do
governador ressaltam que em nenhuma das acusações há qualquer comprovação de
veracidade nas denúncias”.
Ainda de acordo com a nota, “a assessoria
jurídica reforça que nas próprias conversas mencionadas pela reportagem, os
diálogos são claros no sentido de que não houve qualquer tipo de acerto em
troca de apoio. Todas as palavras relacionadas à campanha foram proferidas pelo
detento, sem que tenha havido qualquer contrapartida do interlocutor, no caso o
major Carliomar Brandão”.
Sobre o major continuar
trabalhando para o governo, em cargo de confiança, a nota diz que “as denúncias
não foram comprovadas e ainda não houve julgamento do caso, o que, portanto,
não impede que o major exerça qualquer cargo público”.
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