Foto: Antonio Cruz/Agencia Brasil |
Ação do Ministério Público
Federal (MPF) ajuizada no Acre quer garantir aos estudantes de escolas públicas
militares e cívico-militares o direito a não seguir “padrões estéticos e de
comportamentos baseados na cultura militar” que não estejam relacionados à melhoria
do ensino. Se acatada, a proposta terá abrangência nacional.
Segundo os procuradores, a
questão está relacionada à garantia de direitos fundamentais, como liberdade de
expressão, intimidade e vida privada. Assim sendo, as condutas impostas pelos
militares não se aplicariam a cabelos, unhas, maquiagem, tatuagem ou formas de
vestir dos estudantes.
Além disso, a ação pede que os
colégios “se abstenham de punir os alunos em virtude da apresentação pessoal”.
Para o MPF, a imposição de padrão estético uniforme aos alunos tem “impacto
negativo desproporcional em indivíduos de grupos minoritários”, além de revelar
“verdadeira discriminação injustificável diante do atual regime constitucional”.
Entre as determinações
apresentadas pelos colégios militares está a de que “cabelos volumosos serão
usados curtos ou presos”, enquanto os cabelos curtos podem ser soltos, o que
representa, segundo o MPF, “racismo institucional com as pessoas pretas e
pardas, com cabelos cabelos crespos e cacheados”.
Ainda segundo a ação, “a
valorização do cabelo afro significa expressão de luta e faz parte da
redefinição da identidade negra”.
Visão limitada
O MPF argumenta que essas escolas
proíbem, também, comportamentos como “mexer-se excessivamente” ou “ler jornais
contra a moral e bons costumes”. Na avaliação dos procuradores, isso é
incompatível com o Estado Democrático de Direito e com a liberdade de
expressão.
Em nota, o procurador da
República Lucas Costa Almeida Dias afirma que as restrições estéticas
implantadas pelo modelo de militarização das escolas “seguem uma visão de mundo
limitada da realidade, absolutamente incompatível com a virada paradigmática
produzida pela Constituição Federal e, especialmente, sem nenhuma vantagem
comprovada na experiência de aprendizado”.
Ele acrescenta que a recente
deliberação do Executivo Federal de encerrar o Programa Nacional das Escolas
Cívico-Militares (Pecim) não repercute na referida ação civil pública porque “o
objeto da providência judicial é mais amplo, já que também abarca o regime das
escolas públicas militares estaduais e federais”.
A ação do MPF apresenta dados –
inclusive de violência e abusos praticados em escolas militares – comprovando
que a transferência da direção de escolas a militares sem experiência ou
formação pedagógica, sob o pretexto de implantar disciplina, “acaba por
importar para o ambiente escolar outras problemáticas da vivência militar”.
Via Agencia Brasil
O ilustre procurador da República Lucas Costa Almeida Dias está coberto de razão.
ResponderExcluirNão se pode, em nome do civismo condicionar a educação a um modelo de ensino fundado em métodos e valores castrenses, retirando do professor a sua liberdade de cátedra e impondo ao aluno, de forma coercitiva, obediência a regras, posturas, atitudes e práticas da tradição militar, porque isso não é educar, mas reduzir o estudante à condição de mero objeto modelado, lapidado e alienado política e socialmente.
O aluno, seja na educação infantil, no ensino fundamental ou no ensino médio, precisa de ambientes adequados para desenvolver espontaneamente - de forma livre e saudável -, suas habilidades cognitivas, sociais e emocionais. A escola há de ser sempre a base de construção desse processo de desenvolvimento e aprendizagem; e o professor, a fonte de construção do conhecimento necessário à formação e desenvolvimento do aluno.
A educação funda-se sobretudo nos ideais de liberdade e de solidariedade humana, tendo como principal finalidade o pleno desenvolvimento do aluno para o exercício da cidadania e sua qualificação profissional.
Transcreva-se aqui, por oportuno, o artigo 3º da Lei 9.394/1996 (lei das diretrizes e bases da educação nacional).
Art. 3º O ensino será ministrado nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas;
IV - respeito à liberdade e apreço à tolerância;
V - coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
VI - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
VII - valorização do profissional da educação escolar;
VIII - gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino;
IX - garantia de padrão de qualidade;
X - valorização da experiência extra-escolar;
XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais.
XII - consideração com a diversidade étnico-racial.
XIII - garantia do direito à educação e à aprendizagem ao longo da vida.
XIV - respeito à diversidade humana, linguística, cultural e identitária das pessoas surdas, surdo-cegas e com deficiência auditiva.
Sim, não há dúvidas de que a imposição de "padrão estético" uniforme a estudantes em escolas militares viola o direito à liberdade de expressão, à intimidade e à vida privada, inibindo o fortalecimento de valores humanos e cívicos tão importantes na formação de cidadãos e tão essenciais para o desenvolvimento da sociedade como um todo.