Ataque de índios korubo ao povo matís deixa dois mortos e provoca alerta no Vale do Javari, no Amazonas
A União dos Povos Indígenas do
Vale do Javari (Univaja), no Amazonas, informou nesta segunda-feira (08) que
duas lideranças indígenas da etnia matís foram mortas a bordunadas por quatro
índios isolados do povo korubo na aldeia Todowak, no rio Coari, em 05 de
dezembro, na Terra Indígena Vale do Javari, no extremo oeste do Amazonas,
fronteira com o Peru.
Em entrevista à agência Amazônia
Real, o indígena da etnia marubo e membro da Univaja, Manoel Chorimpa, disse
que as lideranças mortas, Ivan e Damã, estavam na roça quando foram atacadas
pelos korubo com bordunas.
A Funai (Fundação Nacional do
Índio), em Brasília, confirmou as mortes dos matís. O Coordenador Geral de
Índios Isolados e Recém Contatados, Carlos Travassos, classificou o ataque como
uma quebra de protocolo entre as duas etnias da Amazônia. “Na memória dos matís
sempre ocorreu uma situação oposta, os matís que atacavam os korubo. Os matís
sempre roubaram as mulheres dos korubo, mas isso (mortes) nunca ocorreu”,
disse.
Segundo Carlos Travassos, os dois
matís mortos, Ivan e Damã, eram lideranças respeitadas. “Ivan participou
de contatos com os índios korubo por vários anos”, afirmou coordenador.
Em nota enviada à agência Amazônia
Real, a Univaja afirma que após o ataque dos korubo, 30 guerreiros matís
partiram para selva para revidar as mortes, numa ação classificada pela
organização como um confronto inter étnico motivado por “grande revolta” e
resultado do descaso da ação indigenista da Funai na região do Vale do Javari.
A Funai negou a ocorrência de
revide dos matís contra os korubo. Segundo Carlos Travassos, os matís estão
reunidos por conta do luto das lideranças. “Não há informações sobre revide ao
ataque”, disse o coordenador.
Possíveis motivos do ataque
Segundo a nota da Univaja, a
motivação do ataque aos matís seria a remoção de um subgrupo de índios korubo
recém contatados. “Os índios do Subgrupo foram trazidos para o período de
quarentena na Base de Vigilância da Frente Etnoambiental da Funai na
confluência dos rios Itaquaí e Ituí. Depois foram levados para aldeia dos
korubo de recente contato ao invés de ser devolvido ao local, onde estava o
restante do seu grupo”, diz trecho da nota.
A Univaja afirma na nota que a
situação de possível conflito entre as etnias foi alertada através de notas e
ofícios à Funai. “Tem indígenas isolados chegando em quase todas as comunidades
dos que já são contatados e que precisava uma ação de vigilância permanentes
com estrutura adequada sobre índios isolados da tutela da Funai, bem como
precisava melhor proteção do próprio território, com condições financeiros e um
quadro de pessoal, para operacionalização de atividades, do abandono de postos
de vigilâncias”, afirmou a organização indígena.
A Funai disse que está
investigando o motivo do ataque dos korubo aos matís. O coordenador Carlos
Travassos afirmou que o ataque não tem relação com o subgrupo korubo recém
contatado. “A Funai possui informações suficientes para concluir que a situação
(o ataque) não têm relação com esse Subgrupo recém contatado. A criação da
aldeia Todowak (dos matís), em 2011, aproximou as duas etnias, mas o motivo dos
ataques está sendo investigado. Todo mundo sabe que conflito pode acontecer
entre índios isolados e com quem está perto do território deles”, disse
Tavares.
O último contato de índios
korubo, segundo a Funai, aconteceu no dia 09 de
setembro. Os korubo mantiveram diálogos com indígenas da etnia Kanamari da
aldeia Massapê, que fica também na Terra Indígena Vale do Javari.
A Terra Indígena do Vale do
Javari está localizada no município de Atalaia do Norte, distante a 1.136
quilômetros de Manaus. Na reserva vivem cinco povos contatados: marubo,
kanamari, mayoruna, matís e kulina. Há também pelo menos 16 referências de
índios isolados ou de pouco contato, segundo a Funai. A estimativa populacional
indígena no Vale do Javari é de cinco mil pessoas.
Conflito entre etnias
Em entrevista à agência Amazônia
Real, o indígena da etnia marubo, Manoel Chorimpa, atribuiu o ataque dos korubo
à suspeita destes de que os matís teriam sido os responsáveis por remover o
subgrupo que havia sido contatado pela Funai. Para os korubo, este grupo
continua “desaparecido”.
Segundo Chorimpa, o subgrupo
composto por seis pessoas, entre elas três crianças, apareceu no rio Itaquaí,
próximo à aldeia Massapê, onde vivem os índios da etnia kanamari, e foi mantido
em quarentena pela Frente Etnoambiental da Funai que atua no Vale do Javari.
Ele disse que, em seguida, o
subgrupo foi levado pela Funai para a aldeia korubo na área do rio Ituí, onde
vivem indígenas conhecidos como “grupo da Maiá”, contatado em 1996 pelo órgão
indigenista. Este pequeno grupo korubo, que deixou de ser isolado, é composto
por 17 pessoas. Maiá é a principal liderança do grupo.
“O problema é que a Funai, ao
invés de devolver os índios para o grupo deles decidiu mantê-lo na sua base
etnoambiental e depois levá-lo para a aldeia da Maiá. A Funai fez isso para
evitar transtorno com os kanamari, mas acabou causando conflito com os matís”,
disse Chorimpa, que está acompanhando os acontecimentos por meio de comunicação
via radiofonia tanto com os kanamari quanto com os matís. Naquela área não pega
sinal de celular.
A preocupação agora é com um
conflito iminente. Indígenas matís, inclusive os que moram na cidade de Atalaia
do Norte, seguiram para suas aldeias para se vingar da morte dos dois membros
de sua etnia.
O coordenador da Funai em Atalaia
do Norte, Bruno Pereira, junto com outros três servidores seguiram para a área
dos matís no mesmo dia das mortes, segundo Chorimpa.
Ele afirmou que uma das medidas
que já está sendo feita pela Coordenação Regional da Funai de Atalaia do Norte
é transferência dos indígenas matís da aldeia Todowak para a aldeia Tawaya, no
rio Branco, para evitar novos confrontos. Chorimpa disse que mantém contato com
o coordenador regional da Funai, Bruno Pereira, por equipamento de radiofonia.
“Tentamos convencer o coordenador
a não ir neste momento. Não sabemos o que pode acontecer com ele. Trinta 30
matís seguiram para a área onde ocorreram as mortes, mas soubemos que neste
domingo (07) eles retornaram e decidiram não atacar os korubo por enquanto. Mas
é só o que sabemos até agora”, disse Chorimpa.
Segundo Manoel Chorimpa, o
território dos matís fica próximo à área onde vive o grupo de korubo. “Há quase
três anos os matís decidiram voltar à sua área tradicional, nos rios Branco e
Coari. Só que ela fica bem próximo da área dos korubo. Isso pode provocar algum
conflito”, disse ele.
Manoel Chorimpa afirmou que há
uma recente preocupação dos indígenas com o aumento da frequência dos contatos
de alguns subgrupos de índios isolados no Vale do Javari. Mas ele não sabe
dizer o motivo.
“Pelos depoimentos que
conseguimos deste subgrupo que fez contato em setembro, ficamos sabendo que o
problema é que vem aparecendo muitas doenças, muita gente morrendo de malária.
Mas não sabemos ao certo. É preciso apurar”, disse.
Conforme o indígena marubo, o
maior problema está na pouca estrutura financeira e de quadro de pessoal da
Funai na área. “Houve o concurso, mas a maioria dos que passou já foi embora. A
Funai quase não possui recursos humanos. É preciso ter mais gente pelo menos
para preservar a integridade física dos indígenas. Se isto não acontecer, pode
acontecer uma tragédia total”, afirmou.
A reportagem não conseguiu falar
com lideranças matís. Segundo Chorimpa, todos os matís que estavam em Atalaia
do Norte seguiram para suas aldeias.
“Muitos foram de balieira e
pec-pec (pequenas embarcações de motor) ou de helicóptero da coordenação. Mas
eles não quiseram ficar. Decidiram seguir pois não gostaram de saber da morte
de dois parentes desta forma”, disse Chorimpa. A população de índios matís é
pouco de 300 pessoas.
Em nota enviada à reportagem, a
Funai disse que o grupo de korubo contatado em 9 de setembro não possuí
relação, “até onde se pode verificar, com o grupo denominado ‘korubos do
Coari’, os prováveis envolvidos neste conflito”.
Segundo a Funai, os coordenadores
da Coordenação Regional do Vale do Javari, Bruno Pereira, e da Frente de
Proteção Etnoambiental Vale do Javari, Beto Vargas, se encontram desde domingo
(7) na aldeia Todowak, prestando o apoio necessário à comunidade e aos parentes
dos matís mortos.
Índios isolados
Em seu site na internet, a Funai
afirma que são considerados “isolados” os grupos indígenas que não
estabeleceram contato permanente com a população nacional, diferenciando-se dos
povos indígenas que mantêm contato antigo e intenso com os não-índios.
É a Coordenação Geral de Índios
Isolados e Recém Contatados, por meio das Frentes de Proteção Etnoambiental, a
responsável pela proteção dos povos indígenas isolados e de recente contato. A
coordenação garante também aos povos isolados o pleno exercício de sua
liberdade e das suas atividades tradicionais sem a necessária obrigatoriedade
de contatá-los.
Conforme a Funai, atualmente no
Brasil existem cerca de 107 registros da presença de índios isolados em toda a
Amazônia Legal. Esse ano dois grupos isolados fizeram contatos. Além dos
korubo, no dia 29 de junho índios denominados “Povo do Rio Xinane” entraram em
contato com indígenas Ashaninka da aldeia Simpatia, na fronteira do Acre com o
Peru.
Amazoniareal.com.br
Lamentável o ocorrido. Resta lembrar que os korubus a muito tempo são perseguidos na fase de aproximação. Quanto aos Matís, que eu os conheço, são doceis e de fácil comunicação.O problema é grande para a FUNAI resolver
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