Inicialmente, gostaria de destacar que não acho que esses programas
sejam geradores ou alimentem a violência. Essa linha de raciocínio
generalizou-se, especialmente dentre aqueles que se julgam em nível superior a
este tipo de programação. Nunca assistiram, mas sabem de tudo.
Ainda que criticáveis, programas
policiais poderiam se utilizar de um formato menos apelativo, com maior
interatividade e mais produtivo para a emissora e para a sociedade.
Como na televisão tudo é copiado,
umas copiam tudo, outras plagiam algumas coisas e a maioria muda apenas a
moldura, os programas possuem características comuns a todos e nem na guarnição
se diferenciam.
Os apresentadores falam sempre em
tom de provocação, com fisionomias de ira e palavras ofensivas aos “bandidos”.
Não se atentam nem sequer que no momento do ato, por mais verídico que seja e
indícios de autoria que possuam. Esses supostos “bandidos” ainda não se
enquadram nesse conceito, condição que atingiriam quando da condenação.
Outro ponto controverso são os
repórteres interpelando-os quando já estão sob a tutela do Estado, quando
detidos em flagrante nas ruas, dentro das viaturas ou nas próprias delegacias.
Não se discute a cobertura, a discussão é sobre o microfone enfiado, de forma
virulenta e provocativa, na boca do “bandido”, com perguntas inquisitórias,
próprias das autoridades policiais ou judiciais. E quando as respostas não lhes
são agradáveis, os repórteres vociferam, com expressões de ódio e palavras
ofensivas, como se tivessem esse direito ao prejulgamento.
Quando não agem assim, dos
estúdios, os âncoras incentivam de forma acintosa e até com certo
constrangimento os “seus” repórteres. Costumam repetir “meu” ou “nosso”
repórter. Uns dizem: “vai meu filho”, outros, “chega lá” ou com outras
expressões similares.
O inverso é proporcional e melancólico.
Ao lado das eventuais vítimas pobres, os repórteres falam com voz empostada,
sentimental, melodramática. Tratam sempre com expressões no diminutivo: as
“roupinhas”, os “sapatinhos”, os “brinquedinhos”, as “comidinhas” ficaram aqui
jogadas.
Outra prática recorrente são os
apresentadores se voltarem contra as autoridades envolvidas exigindo
explicações que não são possíveis naquele momento ou deixando-as por horas a
fio com um microfone na boca, talvez de olho na subida da audiência. Talvez por
receio a esses pontos ou para ter alguns minutos de fama, muitas autoridades,
especialmente policiais, ficam lá no aguardo pelo tempo que a televisão
necessitar.
Fica parecendo que as autoridades
são funcionários exclusivos de determinado canal e não agente público. Tudo sob
a batuta do direito da “sociedade” ser informada. Não se tocam que esse direito
não pode interferir no direito dos agentes trabalharem tranquilos e
adequadamente.
O autoritarismo e grosseria dos
âncoras com relação aos colegas de trabalho fecham o ciclo das características
específicas, em especial com os funcionários-técnicos. Sempre em tom
áspero e de ordem seca, falam: “Sobe a tela, baixa a tela”; “abre-fecha-divide
a tela”; “cadê o repórter tal”, “fala, meu filho”, “tô falando, meu filho”;
“não atravessa, meu filho”. E, ainda, pedem aos repórteres para colocarem o
microfone para falarem mal dos “bandidos” ao vivo. Quem e por que permitem
esses abusos? E quem disse que eles têm esse direito?
É um festival de descompostura
pública que, por conta da busca por mais telespectadores, nenhum diretor
reprime ou exige uma conduta mais decente e respeitosa pelos ditadores dos
microfones.
Pedro Cardoso da Costa –
Interlagos/SP para o JV
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